Vaticano: Papa pede «abordagem humana à educação» das novas gerações

O Papa recebeu esta quarta-feira, em audiência, uma delegação do projeto global Researchers Advancing Catholic Education Project” (GRACE). Aos educadores Francisco pediu “uma abordagem humana" e desafiou ao "risco" para educar "cabeça, coração e mãos", sempre "ao lado dos mais novos"

Leia, na íntegra, a  reflexão do Santo Padre 

 

Palavras de Improviso

Muito obrigado pela visita. Morei na Irlanda, em Dublin, em Milltown Park, para estudar inglês. Eu estudei inglês, mas esqueci-me, perdoem-me! Falarei em italiano. Obrigado pela vossa visita. Estou feliz, principalmente depois de a ouvir [vira-se para o líder do grupo]. Eu entendi quase tudo, mas falou a cem por hora e às vezes eu não entendi! Mas gostei dessa visão de educação - digo com as minhas próprias palavras - na tensão entre o risco e a segurança. É uma coisa linda o que vós fazeis. Temos que quebrar com aquele imaginário sobre a educação, segundo o qual educar é encher a cabeça de ideias. Então educamos autómatos, macrocefálicos, não pessoas. Educar é arriscar na tensão entre cabeça, coração e mãos: em harmonia, a ponto de pensar no que sinto e faço; sentir o que penso e faço; fazer o que sinto e penso. É uma harmonia.

Mas é preciso ter o fio de Ariadne para sair dos labirintos... Penso também no labirinto da vida: o menino ou a menina que está em crescimento não compreende tantas coisas; qual é o fio de Ariadne que ajuda os jovens a não se perderem no labirinto? Caminhar em conjunto. Não é possível educar sem caminhar conjuntamente com as pessoas que se estão a educar. É bom quando tu encontras educadores que caminham em conjunto com os meninos e as meninas. E tu [no subtítulo do livro que me deste] dizes uma coisa muito bonita: “When Rhetoric Meets Reality” [Quando a retórica encontra a realidade]. Educar não é dizer coisas puramente retóricas; educar é aproximar o que é dito com a realidade. As meninas e os meninos têm o direito de errar, mas o educador acompanha-os no caminho para orientar estes erros, para que não sejam perigosos. O verdadeiro educador nunca se espanta com os erros, não: acompanha, pega na mão, ouve, dialoga. Não se assusta e espera. Isto é a educação humana. Como podeis ver, existe um abismo entre o legado da educação macrocéfala e a educação em si mesma, que é este levar para diante e fazer crescer, isto ajuda a crescer. Agradeço-vos por esta abordagem humana à educação. Em frente, coragem!

A última coisa que ela [volta-se novamente para a líder do grupo] se referiu: o diálogo entre jovens e idosos é importante. Muito importante. Mesmo contornando os pais: não como uma rebelião, mas para buscar a fonte. As raízes, as raízes. Porque a árvore, para crescer, precisa de relações estreitas com as raízes. Não ficar preso nas raízes, não, mas estar em relação com as raízes. Lembro-me de um poeta da minha terra que diz uma coisa linda: "Tudo o que a árvore tem em flor vem do que ela tem no subsolo". Sem raízes, nenhum progresso pode ser feito. Só com as raízes nos tornamos pessoas: não estátuas de museu, como alguns tradicionalistas frios, engomados, rígidos, com o pensamento de que prover a vida significa viver preso às raízes. Há necessidade desta relação com as raízes, mas também de ir adiante, avançar. E esta é a verdadeira tradição: tirar do passado para seguir em frente. A tradição não é estática: é dinâmica, voltada para diante. Havia um teólogo francês do século V, um monge, que se perguntava, falando sobre isto, como é que o dogma poderia progredir sem arruinar a inspiração da própria tradição, como deveria crescer sem se esconder no passado. E disse em latim: "Ut annis scilicet consolidetur, dilatetur tempore, sublimetur aetate": progride consolidando-se ao longo dos anos, desenvolvendo-se ao longo do tempo, sublimando com a idade. “Consolidetur, dilatetur tempore, sublimetur aetate”, esta é a tradição: é preciso educar na tradição, mas para crescer.

Obrigado, muito obrigado pelo vosso trabalho. Obrigado, obrigado. E agora eu vou abençoar-vos, a vós que vindes da verde irlanda!

No final do encontro o Papa Francisco entregou aos presentes o seu discurso, escrito para a ocasião, e que reproduzimos na íntegra.

Caros amigos,

Estou grato por vos saudar, membros do Global Researchers Advancing Catholic Education Project, por ocasião da vossa peregrinação a Roma. Que a alegria destes dias pascais encha os vossos corações, e o vosso encontro aqui na Cidade Eterna vos fortaleça na fidelidade ao Senhor e à sua Igreja e enriqueça o vosso empenho em realçar a especificidade da visão católica da educação.

Numa época saturada de informações, muitas vezes transmitidas sem sabedoria ou sentido crítico, a tarefa de formar as presentes e futuras gerações de professores e alunos católicos é ainda mais importante. Como educadores, sois chamados a alimentar o desejo de verdade, de bondade e de beleza que habita o coração de cada pessoa, para que todos aprendam a amar a vida e a abrir-se à plenitude da vida. Isto implica o discernimento de formas inovadoras de combinar a pesquisa com as melhores práticas, para que os professores possam servir a pessoa como um todo, num processo de desenvolvimento humano integral. Em poucas palavras, isto significa formar ao mesmo tempo a cabeça, as mãos e o coração: preservar e potencializar o vínculo entre aprender, fazer e sentir no sentido mais nobre. Desta forma, podereis oferecer não apenas um excelente histórico académico, mas também uma visão coerente da vida inspirada nos ensinamentos de Cristo.

Neste sentido, a obra educativa da Igreja visa não só «Assegurar a maturidade da pessoa humana humana, […] mas tende principalmente a fazer com que os batizados, enquanto são introduzidos gradualmente no conhecimento do mistério da salvação, se tornem cada vez mais conscientes do dom da fé que receberam» (Concílio Ecuménico Vaticano II, Declaração Gravissimum educationis, 2). A fé é uma grande graça que cada um de nós deve cultivar diariamente e ajudar os outros a cultivar também. À luz da fé, educadores e estudantes passam a estimar-se igualmente como filhos amados de Deus, que nos criou para sermos irmãos e irmãs na única família humana. Nesta base, a educação católica compromete-nos, entre outras coisas, a construir um mundo melhor, ensinando a convivência mútua, a solidariedade fraterna e a paz. Espero que estes dias de diálogo e discussão vos ajudem a desenvolver ferramentas eficazes para promover estes valores, em todos os níveis das suas instituições académicas e nas mentes e corações dos vossos alunos.

Ao mesmo tempo, a educação católica é também evangelização: testemunhar a alegria do Evangelho e a sua capacidade de renovar as nossas comunidades dando esperança e força para enfrentar com sabedoria os desafios atuais. Espero que esta visita de estudo inspire cada um de vós a renovar com zelo generoso a resposta à vossa vocação de educador; renovar o compromisso de consolidar as bases de uma sociedade mais humana e solidária; para espalhar o reino de Cristo, o reino da verdade, santidade, justiça e paz.

Agradeço e encorajo-vos a continuar no vosso importante trabalho e peço-vos, por favor, que rezeis por mim. Confio todos vós à amorosa intercessão de Maria, Mãe da Igreja, e de coração concedo a minha Bênção como penhor de alegria e de paz em Cristo Ressuscitado, nosso Salvador. E por favor, não vos esqueçais de orar por mim. Obrigado!

Tradução Educris a partir do original em italiano!

Imagem: Vatican Media

Educris|21.04.2022



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